top of page

Rock in Rio, Rennan da Penha e uma sentença ilegal

Atualizado: 20 de mar. de 2020

Coluna assinada por Renan Araújo


Foto: Reprodução/Instagram


No Rock in Rio 2019, diversos artistas prestaram homenagens ao DJ Rennan da Penha, um dos criadores do funk 150 BPM e líder do Baile da Gaiola, preso desde abril deste ano. Emicida, Heavy Baile e MC Carol criticaram sua prisão e lembraram sua importância para a difusão nacional do funk, que ganhou novos públicos após a criação da batida acelerada da qual Rennan foi precursor. Por uma série de razões, a prisão de Rennan é provavelmente o exemplo mais notável de um processo amplo: a criminalização do funk.





Primeiramente, Rennan da Penha é um dos maiores nomes da história do funk brasileiro. Além de ser pioneiro da revolução 150 BPM, Rennan produziu diversas músicas icônicas, como “Hoje Eu Vou Parar Na Gaiola”, de MC Livinho (com mais de 232 milhões de views no YouTube) e “Me Solta”, de Nego do Borel (com mais de 172 milhões de views), música pela qual atualmente concorre ao Grammy Latino. Além disso, fundou e liderou o que é indiscutivelmente o mais famoso baile funk do país, o Baile da Gaiola, que chega a reunir mais de 20 mil pessoas (vale a pena ver este vídeo de um minuto para entender). Diante da importância do artista para um gênero tão popular, sua prisão é especialmente relevante.


Em segundo lugar, a justificativa jurídica da prisão de Rennan está intimamente ligada à sua importância para o funk. Basta ler o texto da sua condenação para entender a clara visão pejorativa dos julgadores em relação ao gênero e aos bailes (na íntegra aqui, com o trecho relativo a Rennan a partir da pág. 31):



Trechos selecionados do acórdão do julgamento da Apelação nº 0233004-17.2015.8.19.0001, julgado pela 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em 25/10/2018.

"A suposta relação necessária entre o funk e o tráfico"


Há outros argumentos absurdos ao longo do acórdão, baseados em posts de redes sociais, por exemplo. Contudo, o fundamento principal é, sem dúvidas, a suposta relação necessária entre o funk e o tráfico. Trata-se de uma lógica deturpada: se Rennan é o principal líder do funk na Penha, inevitavelmente estará envolvido com o tráfico. Com essas provas, o Tribunal o considerou “olheiro” e incentivador do tráfico. Sua pena foi fixada em 6 anos e 8 meses de reclusão e pagamento de mais de 30 mil reais.


Enxergar de forma preconceituosa uma relação necessária entre tráfico e funk não é postura exclusiva do Judiciário. Ao assumir, o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, deixou clara a ordem para acabar com os bailes: o Baile da Gaiola encontra-se suspenso desde fevereiro após trocas de tiros em operações policiais malsucedidas. Até mesmo alguns setores da iniciativa privada parecem ter receio do funk no Brasil: diferentemente do Rock in Rio, o Lollapalooza brasileiro de 2019 não contou com nenhum funkeiro, apesar de ter levado MC Kevinho para a edição chilena. Por fim, a prisão de artistas do funk e produtores culturais das comunidades de menor repercussão é rotineira: de MCs do Rio à prisão de Ojuara no Recife.


Foto: Reprodução/Instagram

O funk, por outro lado, representa o oposto desse imaginário reacionário. No primeiro episódio do podcast recifense Embrazado, Guilherme Pimentel reflete sobre como o funk é um elemento de união entre comunidades: “se ele brigar com o rival da outra comunidade, não vai poder entrar lá para ver a boyzinha dele no baile”. A diversão da festa funk dá uma trégua na violência e serve como propulsora de um empreendedorismo que, sem o baile, não subsistiria. Além disso, fortalece uma economia criativa, dando oportunidades em setores que tradicionalmente não são economicamente viáveis às comunidades, como música, produção de vídeo e dança, drenando recursos humanos do crime.


Diante de tal contexto, é preciso refletirmos. Um dos maiores expoentes de um ritmo onipresente está preso ilegalmente e pouco se fala disso. Apesar de popular entre diversos públicos, apenas os artistas negros e vindos da periferia protestaram contra sua prisão no Rock in Rio deste ano. O quanto a criminalização do funk vai além das instituições e está enraizada no imaginário do público? Falemos mais, ajamos mais. Liberdade para Rennan da Penha já.

תגובות


bottom of page