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Chão firme: vidas afetadas por deslizamentos de terra no Grande Recife

Atualizado: 19 de mar. de 2020

   



Medo e apreensão. Para milhares de pessoas do Grande Recife, as chuvas são sinais de risco à vida e perda dos seus chãos, sobretudo durante a época do inverno. Segundo dados do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, o Recife possuía 206 mil moradores em áreas propensas a desastres naturais, como deslizamentos, enchentes e inundações. A capital pernambucana é a quinta colocada no ranking das cidades brasileiras. A combinação de fortes chuvas, desordenamento urbano e falta de políticas eficazes de moradia coloca em risco todos os anos quem não tem um chão firme para ficar.


Durante dois meses, a equipe do Retruco conversou e mapeou famílias que moram em encostas no bairro do Ibura, na Zona Sul do Recife, e em Camaragibe, na Região Metropolitana (RMR). Separadas por mais de 20 quilômetros, as localidades são aproximadas pela dor, pelo medo e pela apreensão da chegada do inverno chuvoso. E, pelo contrário do que aponta no dicionário, o medo desses moradores não é irracional. No inverno de 2019, 21 vidas foram soterradas pela lama. Lama que cobriu, só nesta quarta-feira (24), 12 pessoas no Recife, em Olinda e em Abreu e Lima. No mês passado, já havia chovido acima do normal e 10 pessoas morreram.


Seis delas pertenciam à família do pedreiro Linderson Albuquerque de Melo, 27 anos. Não havia um chão firme para sustentar a sua casa durante o temporal que atingiu Camaragibe e outras cidades do Grande Recife. Sua esposa, duas filhas e três enteados foram levados com o deslizamento da barreira. Não restou nada, apenas a lembrança das tentativas de resgates dos familiares. Foram mais de 24 horas junto aos bombeiros, vizinhos e outros voluntários. “Eu gritei Lucas, Bianca, painho, Beatriz, ‘Mô’… Gui... Só grito de alerta, grito com nome. Algum sinal, mas, perdi todo mundo...”, conta, apontando para o local onde existia a casa.


O grito de alerta, de socorro, com “nome” de Linderson não é o primeiro. Desde a década de 60, moradores da RMR e da Zona da Mata de Pernambuco gritam em alerta de parentes soterrados. Gritam pelo socorro dos órgãos públicos. Há nove anos, por exemplo, 20 mortes foram confirmadas e mais de 27 mil pessoas ficaram desabrigadas com as enchentes que atingiram a Mata Sul do Estado. Quase uma década depois, Pernambuco ainda não está preparado para os meses de abril, maio, junho e julho. As ações são paliativas e não resolvem anos, décadas e séculos de falta de planejamento urbano e despreocupação com mananciais e biomas que protegem as cidades de eventos climáticos.


Contudo, o problema também envolve políticas de moradia. O déficit habitacional do Estado é de 285 mil imóveis, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD C). Na capital, o número é de 30 mil. Quase metade da população pernambucana mora em condições inadequadas e sem saneamento básico. De acordo com levantamento do IBGE, mais de 5% da população residente em Pernambuco possui ônus excessivo com aluguel de moradia, ou seja 30% do seu orçamento. Além disso, os R$ 200,00 de auxílio moradia não atendem as demandas da população, tendo em vista o alto preço do m² no Grande Recife.


Imagens: Thiago Santos | Retruco


São números refletidos pelas histórias de personagens da nossa reportagem. Sandra Silva, Alexandra Claudino, Wanderson Silva, Carlos Alberto e Maria das Dores compartilham, além da apreensão, o acúmulo de problemas sociais que se intensificam na falta de uma moradia digna.


Texto por Bruno Vinícius Videorreportagem por Ademara Barros, Camila Queiroz e Thiago Santos


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