A importância dos cargos legislativos se potencializa quando protagonizada por pessoas LGBTQIA+ e beneficia a todos. Robeyoncé Lima, Luiza Carolina e Vinícius Castelo comentam sobre.
“Lula não estará lá sozinho”, foi o que afirmou a advogada e candidata à deputada federal Robeyoncé Lima (PSOL), sobre a possibilidade de estar junto ao líder das pesquisas para presidência em Brasília - na construção e políticas públicas voltadas à educação, moradia e saúde de pessoas trans.
A fala faz refletir sobre a relevância da eleição também de cargos legislativos para a construção de um projeto mais humano e justo para os brasileiros. Apesar do alvoroço que as eleições presidenciais têm causado na última década, é importante o papel fiscalizador e legislador que o congresso e as assembleias legislativas desempenham.
Mas pouco tem se legislado medidas de melhoria e sobrevivência de vidas LGBTI+ no Brasil como um todo, e como resposta, somos o país que mais mata o grupo. Mas o movimento, já cansado de viver violências ignoradas pelas instituições, tem estimulado um debate sobre a ocupação de corpos dissidentes na política representativa.
“Já que vivemos em um modelo representativo, temos que fazer com que ela seja de fato representativa e amplie a participação de sujeitos e sujeitas. O movimento LGBTI+ tem diversas corroborações para a política", afirmou Luiza Carolina (PSOL), uma das 15 candidaturas LGBTI+ que representam o legislativo em Pernambuco, junto também à Robeyoncé Lima.
Um levantamento feito pela organização VoteLGBT apontou que houve um aumento de 36% de pré-candidaturas desse público comparado a 4 anos atrás. Eram 157, agora são 214. O aumento notável vem graças ao constante debate da sociedade sobre quem é e quem precisa começar a ser olhado e tratado com um olhar de humanidade.
“Queremos trazer uma nova estética para a política do Brasil, um projeto político que busca uma nova ressignificação da política representativa”, pontuou Robeyoncé. Em sua campanha, ela se intitula “A primeira de muitas”, já que, se eleita, seria a primeira deputada federal a representar o T da sigla em 200 anos de Brasil nação.
Enfrentando a burguesia
O atual vereador de Olinda e candidato a deputado estadual Vinicius Castelo (PT) explicou, em entrevista, que aqueles que obedecem a lógica heterocisnormativa burguesa possuem vantagem nas campanhas políticas. “Enquanto marginalizados, nossos corpos enfrentam a falta de humanização. Já entramos no jogo perdendo”. "E os próprios partidos acabam reproduzindo essas estruturas sociais, então a maioria de quem está na direção são homens héteros brancos, e na hora dessas pessoas decidirem as prioridades, nós não somos prioridade”, comentou a candidata Luiza Carolina.
E essa falta de apoio da legenda partidária e resistência acabam impactando também na conversão de candidatura para mandatos efetivos. De acordo com a Aliança LGBT, apenas 30 legisladores foram eleitos em 2018.
“Precisamos do apoio da legenda partidária para chegar lá, e não adianta colocar 30% de mulheres candidatas apenas para cumprir as cotas. A gente já enfrenta tantas injustiças na representação, é necessário um apoio financeiro, político e de acompanhamento de campanha para se ter esse pleito.”, disse Robeyoncé.
Como os partidos atuam?
Qual é a legenda partidária que está disposta a fazer essa diferença estética na política?
Coletamos informações sobre os principais partidos de esquerda:
PT: Em 2018, foi aprovada resolução sobre a cidadania LGBT, que determina a presença de de pessoas travestis e mulheres transexuais nas cotas de 30% reservadas a mulheres seja em disputas internas como nas externas pelo Partido dos Trabalhadores. PSOL: Em resolução referente ao pleito de 2022, o partido aprovou resolução sobre a distribuição do fundo eleitoral para as candidaturas LGBTs, mulheres, negros e negras, indígenas, quilombolas, e pessoas com deficiência. Os citados terão prioridade na divisão dos recursos, recebendo um bônus financeiro na partilha dos recursos do fundo eleitoral. PDT: Apesar do movimento PDT Diversidade, o partido não possui resolução específica sobre destinação de recursos eleitorais ou cota para LGBTQIA+ no pleito de 2022. REDE: Apesar do movimento Elo LGBT, o partido não possui resolução específica sobre destinação de recursos eleitorais ou cota para LGBTQIA+ no pleito de 2022. PSB: Apesar do movimento LGBT Socialista, o partido não possui resolução específica sobre destinação de recursos eleitorais ou cota para LGBTQIA+ no pleito de 2022.
Dos 214 candidatos LGBT levantados pelo VoteLGBT que se candidataram em 2022, 81 são do PSOL (38%, a maioria). Outras 49 candidaturas são do PT e 23 do PSB.
Mas, apesar das dificuldades, casos grandiosos de candidaturas LGBTI+ têm surgido e inspirado novas iniciativas. Uma delas da vereadora Erika Hilton, a mais votada do Brasil, da nordestina Erica Malunguinho, deputada estadual de SP e a mandata coletiva das Juntas, que atua na Alepe, a qual Robeyoncé integra.
“Passamos muito tempo apoiando aliados, mas às vezes, na disputa do próprio poder, nossas pautas são secundarizadas. Por isso decidimos estar no protagonismo. E os aliados são importantes, existem parlamentares héteros que propuseram questões essenciais, mas queremos dar um passo à frente”, comentou Luiza Carolina
Cenário em Pernambuco
Em 2018, as Juntas foram eleitas (das 5 codeputadas, uma mulher é trans, uma lésbica e uma bixessual), mas o Estado não teve nenhum ou nenhuma deputada federal LGBTI+ do movimento. Além disso, vê-se uma omissão por parte do governo do estado para com a população LGBTI+. Como reflexo, tem-se o caso de Roberta, moradora de rua, que estava desabrigada, e veio a óbito depois de 15 dias internada no Hospital da Restauração, pois teve 40% do corpo queimado.
“Não temos um orçamento específico, ainda hoje pedimos uma casa abrigo, que é uma demanda antiga do movimento. Essa ausência, seja de saúde, educação, segurança, moradia e distribuição de renda para a população LGBTI+ diz muito sobre o que é prioridade. A vida da gente, em termos de cidadania, é mais judicializada do que legislada, e no Governo Federal de Bolsonaro não é diferente”, pontuou Robeyoncé.
E, para além da omissão, é possível notar a organização de forças para minar os avanços obtidos que garantem uma cidadania plena. Em 2017 foi aprovado na Alepe um requerimento que solicitada ao Ministério da Educação (MEC) a retirada de expressões da Base Nacional Curricular Comum que contenham relação com a ideologia de gênero, como as palavras “corpo”, “gênero” e “sexualidade”.
Políticos LGBTI+ é benefício para toda a sociedade
Os 3 candidatos entrevistados aqui defendem que a representatividade LGBTI+ na política não se isola das lutas de outros grupos historicamente marginalizados, e é positiva para a sociedade em geral. “Buscamos uma efetiva representação. Só quem sabe o que é discriminação racial, de gênero, quem anda de ônibus, que sabe o que é arealidade. E a mudança vai partir de candidaturas assim, de pessoas que desafiam a lógica financeira e hetero cisnormativa", comentou Vinícius Castelo. Por isso, a necessidade de uma organização dos movimentos LGBTI+ na política representativa para o combate a todo o retrocesso que mobilizações conservadoras orquestram contra a diversidade. “Já está na hora de termos a nossa vida legislada, e não apenas judicializada”, expôs Robeyoncé.
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